Distintos perfis são requeridos à medida que uma startup amadurece.Os amigos que iniciam uma startup comumente têm um mesmo background. Geralmente são técnicos que desenvolvem um produto diferenciado, que sempre pode ser melhorado e precisa ser adequado aos diferentes perfis de clientes. Nesta fase de validação do produto são necessários conhecimento e competência técnica para desenvolver e modificar o produto com agilidade. Essa capacidade de execução rápida, via de regra, requer um perfil mais voltado a tarefas do que a pessoas.
Entretanto, em seguida vem a fase de conquista de mercado e busca do PMF (product-market fit), quando é preciso conhecer e reter os clientes alvo e escutá-los, habilidades que não são tão comuns no perfil técnico típico, que é mais introspectivo e, por ter um conhecimento altamente especializado, pode não ter a humildade e paciência necessárias para escutar e colocar a satisfação do cliente acima das suas próprias hipóteses sobre o que seria o produto ideal. Por outro lado, o perfil comercial típico é voltado mais a relacionamentos do que a execução, e é mais expansivo e generalista, sem paciência para mergulhar em detalhes técnicos.
É raro que uma mesma pessoa reúna em si esses dois perfis tão distintos. O mais comum é que dois sócios se unam com essa complementaridade, um mais técnico e executor, o outro mais comercial e voltado a relacionamento. Essa complementaridade é saudável, mas pode originar conflitos entre personalidades tão distintas se as expectativas não são adequadamente ajustadas à realidade. O técnico quase sempre quer ou necessita mais tempo para melhorar e adequar o produto do que o comercial espera ou precisa. O comercial, por vezes, para satisfazer o cliente promete a entrega de características que ainda estão no roadmap do produto. As diferenças de expectativas e o desconhecimento das dificuldades inerentes a cada uma das atividades podem gerar críticas mútuas e abalar a relação societária.
Se a sociedade passar por este choque de personalidades, vem a fase de escalar o crescimento e consolidar a empresa, quando os conhecimentos e habilidades administrativas para liderar processos e pessoas se tornam mais relevantes do que as habilidades técnicas ou comerciais. Aí, dois cenários podem acontecer:
a) Um dos sócios revela ou adquire as competências administrativas e assume a liderança do empreendimento;
b) A empresa busca no mercado alguém com conhecimento e experiência na administração de empresas.
Ambos os caminhos apresentam desafios. No primeiro caso, o perfil técnico tende a ser mais voltado à organização de processos e funções, enquanto o perfil comercial tem mais facilidade na administração de pessoas. De qualquer maneira, ambas são competências que precisam ser adquiridas ou aprimoradas pela liderança para que a empresa consiga escalar seu crescimento. Esse amadurecimento pessoal pode demorar e atrasar o crescimento do negócio. No segundo caso, a entrada de um novo líder pode gerar resistência entre os fundadores, especialmente se as expectativas não forem ajustadas. Além disso, a atração de executivos experientes pode significar um ônus financeiro não suportado pela geração de caixa do negócio, sendo necessário ceder vesting que complemente a diferença para um salário de mercado ou buscar investimento para poder pagá-lo, o que invariavelmente redunda em redução do capital nas mãos dos fundadores.
O Problema da Liderança
No início de uma startup são poucas pessoas, as decisões são tomadas de forma informal e todos contribuem em múltiplos papéis para resolver os problemas na medida em que se apresentam. Contudo, à medida que a empresa cresce, o aumento do número de colaboradores exigirá que a ação entre amigos se transforme numa empresa com uma estrutura de funções especializadas, que requer perfis e responsabilidades distintas. Estas funções se traduzem num organograma onde as áreas de Operação/Produção, Suporte e Desenvolvimento/Engenharia/Inovação são especializadas e variam conforme o negócio, enquanto as áreas Comercial/Marketing e Administrativo/Financeiro requerem habilidades menos dependentes do produto/serviço. Estas estruturas organizacionais, tipicamente, são hierárquicas estabelecendo diferentes níveis de responsabilidade (o ônus do poder) e de autoridade (o bônus do poder) tendo no topo o CEO ou Presidente como responsável último pelo resultado final da empresa e pela harmonia das diferentes funções.
Numa ação entre amigos todos se consideram iguais e as decisões são tomadas por consenso. Se não há consenso, a decisão é adiada – e o problema em questão tende a piorar. Entretanto, pode haver um sócio que, por ter aportado mais dinheiro no início, ou por ter tido a ideia original do negócio, ou por ter mais conhecimento técnico, é reconhecido pelos demais como CEO e pode dar a última palavra. Porém, a capacidade de liderança não vem com o título de CEO. Líder é quem tem o poder de decisão final, o que deve ser encarado como o ônus da responsabilidade e não pelo bônus do status. Porém, liderança é uma habilidade que precisa ser aprendida e desenvolvida, e depende muito de saber ouvir e ter visão estratégica para avaliar as consequências das decisões em um panorama mais geral e de mais longo prazo. Não se trata de impor suas opiniões sobre os demais, o que embora aumente a agilidade, não necessariamente leva às melhores conclusões e pode destruir o espírito corporativo – aquela boa vontade que leva as pessoas a quererem trabalhar juntas por um objetivo comum.
Mas, como já vimos, a natureza dos problemas e decisões que precisam ser enfrentados variam à medida que a empresa amadurece e, portanto, o perfil de liderança requerido precisa se adequar a cada fase. Na fase de validação do produto e busca do PMF, a liderança é geralmente assumida por um perfil mais empreendedor e desbravador. Capacidade técnica diferenciada, tenacidade, persistência, foco, capacidade de execução, resiliência, motivação e coragem são atributos típicos do perfil empreendedor.[1] O empreendedor é motivado por desafio, não gosta de rotina e burocracia, quer velocidade e mudança. Pode ser mais ou menos técnico, mais ou menos centralizador, mas estas características precisarão ser atenuadas para que a empresa possa crescer.
O empreendedor tecnicamente diferenciado é como um virtuose. Mas uma empresa na fase de crescimento e consolidação funciona como uma orquestra, não como uma exibição simultânea de virtuoses: requer partitura comum, condução e vigilância de um maestro. Já é necessário um maestro com perfil mais político, além do background administrativo, caso contrário a sinfonia arrisca se tornar uma polifonia dissonante. Ram Charan diz que, além das habilidades, são necessárias duas grandes mudanças para que alguém passe a realmente atuar como um líder: mudar seus valores e mudar a forma de alocar seu tempo. Com relação a valores, o líder precisa valorizar realmente o foco no outro, a gestão das pessoas. Para isso é preciso ouvi-las e entender suas aspirações e alinhá-las com os propósitos e valores da organização. Além disso, ter clareza e dar valor para as questões estratégicas do negócio como base da ação comum. A forma de alocar o tempo se torna então uma consequência dessa consciência sobre valores. O líder passa a alocar mais tempo com pessoas e menos tempo em tarefas.
A relação de amizade ou de parentesco entre sócios é uma faca de dois gumes. Facilita a confiança, mas, justamente por isso, dificulta a cobrança. Muitas vezes um sócio cala seu descontentamento com a atitude de outro para não abalar a relação e vai engolindo sapos e girinos até que um dia vomita um Tiranossauro. Quando relações de amizade ou parentesco estão envolvidas, o abalo emocional adicional pode agravar as circunstâncias.
As decisões mais críticas numa empresa são difíceis e controversas, suscitando discussões entre opiniões diferentes. Entre estas, se destacam aquelas relativas aos sócios, e que envolvem não só opiniões, mas interesses distintos. Por isso elas são deixadas de lado para evitar conflitos que, justamente, seriam mais facilmente resolvidos no início, quando todos estão de boa vontade. A discussão de contratos pode antecipar conflitos e abalar a sociedade, mas, provavelmente, estes conflitos se revelariam posteriormente com efeitos maiores e mais negativos, pelo menos para algumas partes. O Acordo de Sócios ou Founders Agreement é certamente o documento mais importante para assegurar um bom relacionamento entre sócios. É um documento privado firmado pelos sócios, ou só por aqueles que formam maioria. Cada parte recebe uma cópia do documento assinado e não há necessidade de registro.
Além do Acordo de Sócios, outros contratos são necessários:
· Contratos de Vesting para sócios de trabalho regulam a aquisição de participação societária condicionada ao cumprimento de metas.
· Mútuos com Opção de Conversão para investidores financeiros.
· Contratos de Consultoria e/ou de Cessão de Propriedade Intelectual para sócios de capital intelectual.
· Contratos de Locação ou de Venda de ativos para sócios de capital econômico formalizam a valorização de ativos cedidos pelos sócios ou colaboradores
É bom que essas entregas iniciais sejam negociadas e tenham seus valores nominais registrados em contrato, mesmo que não sejam pagos. A diferença entre o valor pago e aquele negociado pode ser computada e acumulada para ser usada numa futura aquisição de participação adicional. Pode acontecer que um sócio empreste dinheiro para a empresa, caso em que também se recomenda que se faça um contrato que, eventualmente, pode incluir a conversão em ações como uma forma de pagamento.
O contrato de Vesting regula a aquisição de participação de forma condicionada e progressiva, e pode ser assinado entre os fundadores ou ofertado para atrair e reter colaboradores chave. Ele estipula o que se espera do sócio ou colaborador em termos de dedicação e/ou de resultados e define regras para a recompra pela empresa da participação daqueles que não mantenham o seu comprometimento ou não atinjam os resultados esperados. As condições para que o colaborador faça jus à participação podem incluir não apenas metas que dependam exclusivamente dele, mas também metas para o status econômico-financeiro da empresa. Cliff (penhasco) é o período de tempo no qual o colaborador não tem direito a nenhuma participação. A partir desse tempo, o vesting pode ser gradual ou final. No Vesting gradual, o colaborador recebe, período a período, a participação proporcional àquele período. No Vesting final ele só as recebe ao fim do período. O contrato de Vesting deve especificar as condições de término e perda do direito de aquisição tanto se o colaborador se desligar por vontade própria como se for desligado pela empresa. Também deve definir condições aplicáveis caso a empresa seja vendida ou receba algum investimento durante o período de “vesting”.
A rigor, o Pró-labore dos sócios deveria variar em função da dedicação do sócio, ou do valor de mercado e da responsabilidade da função. É comum que os sócios iniciais coloquem, além do trabalho, capital financeiro, econômico (instalações, equipamentos) ou intelectual (marcas e patentes) e é um erro deixar que isso interfira na atribuição de responsabilidades ou em diferenças na remuneração. Estas diferentes contribuições deveriam ser objeto de contratos específicos que também podem ter cláusulas de conversão em participação.
A remuneração por trabalho não tem nada a ver com a participação societária. O sócio com maior participação pode ter um pró-labore menor do que um sócio minoritário. Além disso, um sócio pode ser demitido como diretor e continuar com sua participação na empresa. A sociedade não tem obrigação de adquirir a sua participação, mas, via de regra, o sócio demitido tende a querer vender. Em muitas startups que ainda não dão lucro e têm seu valuation inflado por investidores de risco, isso pode dificultar a negociação. Mas se o founder demitido se der conta de que é sócio de uma dívida (pois muitos mútuos têm cláusulas de pagamento em caso de não conversão) sobre a qual tem pouca ou nenhuma influência verá que é do seu melhor interesse facilitar e acelerar sua saída da sociedade. No entanto, deve-se cuidar para não gerar grande animosidade, pois numa limitada o sócio demitido pode se recusar a assinar eventuais alterações contratuais necessárias ao bom funcionamento da companhia.
Distintos perfis são requeridos à medida que uma startup amadurece.Os amigos que iniciam uma startup comumente têm um mesmo background. Geralmente são técnicos que desenvolvem um produto diferenciado, que sempre pode ser melhorado e precisa ser adequado aos diferentes perfis de clientes. Nesta fase de validação do produto são necessários conhecimento e competência técnica para desenvolver e modificar o produto com agilidade. Essa capacidade de execução rápida, via de regra, requer um perfil mais voltado a tarefas do que a pessoas.
Entretanto, em seguida vem a fase de conquista de mercado e busca do PMF (product-market fit), quando é preciso conhecer e reter os clientes alvo e escutá-los, habilidades que não são tão comuns no perfil técnico típico, que é mais introspectivo e, por ter um conhecimento altamente especializado, pode não ter a humildade e paciência necessárias para escutar e colocar a satisfação do cliente acima das suas próprias hipóteses sobre o que seria o produto ideal. Por outro lado, o perfil comercial típico é voltado mais a relacionamentos do que a execução, e é mais expansivo e generalista, sem paciência para mergulhar em detalhes técnicos.
É raro que uma mesma pessoa reúna em si esses dois perfis tão distintos. O mais comum é que dois sócios se unam com essa complementaridade, um mais técnico e executor, o outro mais comercial e voltado a relacionamento. Essa complementaridade é saudável, mas pode originar conflitos entre personalidades tão distintas se as expectativas não são adequadamente ajustadas à realidade. O técnico quase sempre quer ou necessita mais tempo para melhorar e adequar o produto do que o comercial espera ou precisa. O comercial, por vezes, para satisfazer o cliente promete a entrega de características que ainda estão no roadmap do produto. As diferenças de expectativas e o desconhecimento das dificuldades inerentes a cada uma das atividades podem gerar críticas mútuas e abalar a relação societária.
Se a sociedade passar por este choque de personalidades, vem a fase de escalar o crescimento e consolidar a empresa, quando os conhecimentos e habilidades administrativas para liderar processos e pessoas se tornam mais relevantes do que as habilidades técnicas ou comerciais. Aí, dois cenários podem acontecer:
a) Um dos sócios revela ou adquire as competências administrativas e assume a liderança do empreendimento;
b) A empresa busca no mercado alguém com conhecimento e experiência na administração de empresas.
Ambos os caminhos apresentam desafios. No primeiro caso, o perfil técnico tende a ser mais voltado à organização de processos e funções, enquanto o perfil comercial tem mais facilidade na administração de pessoas. De qualquer maneira, ambas são competências que precisam ser adquiridas ou aprimoradas pela liderança para que a empresa consiga escalar seu crescimento. Esse amadurecimento pessoal pode demorar e atrasar o crescimento do negócio. No segundo caso, a entrada de um novo líder pode gerar resistência entre os fundadores, especialmente se as expectativas não forem ajustadas. Além disso, a atração de executivos experientes pode significar um ônus financeiro não suportado pela geração de caixa do negócio, sendo necessário ceder vesting que complemente a diferença para um salário de mercado ou buscar investimento para poder pagá-lo, o que invariavelmente redunda em redução do capital nas mãos dos fundadores.
O Problema da Liderança
No início de uma startup são poucas pessoas, as decisões são tomadas de forma informal e todos contribuem em múltiplos papéis para resolver os problemas na medida em que se apresentam. Contudo, à medida que a empresa cresce, o aumento do número de colaboradores exigirá que a ação entre amigos se transforme numa empresa com uma estrutura de funções especializadas, que requer perfis e responsabilidades distintas. Estas funções se traduzem num organograma onde as áreas de Operação/Produção, Suporte e Desenvolvimento/Engenharia/Inovação são especializadas e variam conforme o negócio, enquanto as áreas Comercial/Marketing e Administrativo/Financeiro requerem habilidades menos dependentes do produto/serviço. Estas estruturas organizacionais, tipicamente, são hierárquicas estabelecendo diferentes níveis de responsabilidade (o ônus do poder) e de autoridade (o bônus do poder) tendo no topo o CEO ou Presidente como responsável último pelo resultado final da empresa e pela harmonia das diferentes funções.
Numa ação entre amigos todos se consideram iguais e as decisões são tomadas por consenso. Se não há consenso, a decisão é adiada – e o problema em questão tende a piorar. Entretanto, pode haver um sócio que, por ter aportado mais dinheiro no início, ou por ter tido a ideia original do negócio, ou por ter mais conhecimento técnico, é reconhecido pelos demais como CEO e pode dar a última palavra. Porém, a capacidade de liderança não vem com o título de CEO. Líder é quem tem o poder de decisão final, o que deve ser encarado como o ônus da responsabilidade e não pelo bônus do status. Porém, liderança é uma habilidade que precisa ser aprendida e desenvolvida, e depende muito de saber ouvir e ter visão estratégica para avaliar as consequências das decisões em um panorama mais geral e de mais longo prazo. Não se trata de impor suas opiniões sobre os demais, o que embora aumente a agilidade, não necessariamente leva às melhores conclusões e pode destruir o espírito corporativo – aquela boa vontade que leva as pessoas a quererem trabalhar juntas por um objetivo comum.
Mas, como já vimos, a natureza dos problemas e decisões que precisam ser enfrentados variam à medida que a empresa amadurece e, portanto, o perfil de liderança requerido precisa se adequar a cada fase. Na fase de validação do produto e busca do PMF, a liderança é geralmente assumida por um perfil mais empreendedor e desbravador. Capacidade técnica diferenciada, tenacidade, persistência, foco, capacidade de execução, resiliência, motivação e coragem são atributos típicos do perfil empreendedor.[1] O empreendedor é motivado por desafio, não gosta de rotina e burocracia, quer velocidade e mudança. Pode ser mais ou menos técnico, mais ou menos centralizador, mas estas características precisarão ser atenuadas para que a empresa possa crescer.
O empreendedor tecnicamente diferenciado é como um virtuose. Mas uma empresa na fase de crescimento e consolidação funciona como uma orquestra, não como uma exibição simultânea de virtuoses: requer partitura comum, condução e vigilância de um maestro. Já é necessário um maestro com perfil mais político, além do background administrativo, caso contrário a sinfonia arrisca se tornar uma polifonia dissonante. Ram Charan diz que, além das habilidades, são necessárias duas grandes mudanças para que alguém passe a realmente atuar como um líder: mudar seus valores e mudar a forma de alocar seu tempo. Com relação a valores, o líder precisa valorizar realmente o foco no outro, a gestão das pessoas. Para isso é preciso ouvi-las e entender suas aspirações e alinhá-las com os propósitos e valores da organização. Além disso, ter clareza e dar valor para as questões estratégicas do negócio como base da ação comum. A forma de alocar o tempo se torna então uma consequência dessa consciência sobre valores. O líder passa a alocar mais tempo com pessoas e menos tempo em tarefas.
A relação de amizade ou de parentesco entre sócios é uma faca de dois gumes. Facilita a confiança, mas, justamente por isso, dificulta a cobrança. Muitas vezes um sócio cala seu descontentamento com a atitude de outro para não abalar a relação e vai engolindo sapos e girinos até que um dia vomita um Tiranossauro. Quando relações de amizade ou parentesco estão envolvidas, o abalo emocional adicional pode agravar as circunstâncias.
As decisões mais críticas numa empresa são difíceis e controversas, suscitando discussões entre opiniões diferentes. Entre estas, se destacam aquelas relativas aos sócios, e que envolvem não só opiniões, mas interesses distintos. Por isso elas são deixadas de lado para evitar conflitos que, justamente, seriam mais facilmente resolvidos no início, quando todos estão de boa vontade. A discussão de contratos pode antecipar conflitos e abalar a sociedade, mas, provavelmente, estes conflitos se revelariam posteriormente com efeitos maiores e mais negativos, pelo menos para algumas partes. O Acordo de Sócios ou Founders Agreement é certamente o documento mais importante para assegurar um bom relacionamento entre sócios. É um documento privado firmado pelos sócios, ou só por aqueles que formam maioria. Cada parte recebe uma cópia do documento assinado e não há necessidade de registro.
Além do Acordo de Sócios, outros contratos são necessários:
· Contratos de Vesting para sócios de trabalho regulam a aquisição de participação societária condicionada ao cumprimento de metas.
· Mútuos com Opção de Conversão para investidores financeiros.
· Contratos de Consultoria e/ou de Cessão de Propriedade Intelectual para sócios de capital intelectual.
· Contratos de Locação ou de Venda de ativos para sócios de capital econômico formalizam a valorização de ativos cedidos pelos sócios ou colaboradores
É bom que essas entregas iniciais sejam negociadas e tenham seus valores nominais registrados em contrato, mesmo que não sejam pagos. A diferença entre o valor pago e aquele negociado pode ser computada e acumulada para ser usada numa futura aquisição de participação adicional. Pode acontecer que um sócio empreste dinheiro para a empresa, caso em que também se recomenda que se faça um contrato que, eventualmente, pode incluir a conversão em ações como uma forma de pagamento.
O contrato de Vesting regula a aquisição de participação de forma condicionada e progressiva, e pode ser assinado entre os fundadores ou ofertado para atrair e reter colaboradores chave. Ele estipula o que se espera do sócio ou colaborador em termos de dedicação e/ou de resultados e define regras para a recompra pela empresa da participação daqueles que não mantenham o seu comprometimento ou não atinjam os resultados esperados. As condições para que o colaborador faça jus à participação podem incluir não apenas metas que dependam exclusivamente dele, mas também metas para o status econômico-financeiro da empresa. Cliff (penhasco) é o período de tempo no qual o colaborador não tem direito a nenhuma participação. A partir desse tempo, o vesting pode ser gradual ou final. No Vesting gradual, o colaborador recebe, período a período, a participação proporcional àquele período. No Vesting final ele só as recebe ao fim do período. O contrato de Vesting deve especificar as condições de término e perda do direito de aquisição tanto se o colaborador se desligar por vontade própria como se for desligado pela empresa. Também deve definir condições aplicáveis caso a empresa seja vendida ou receba algum investimento durante o período de “vesting”.
A rigor, o Pró-labore dos sócios deveria variar em função da dedicação do sócio, ou do valor de mercado e da responsabilidade da função. É comum que os sócios iniciais coloquem, além do trabalho, capital financeiro, econômico (instalações, equipamentos) ou intelectual (marcas e patentes) e é um erro deixar que isso interfira na atribuição de responsabilidades ou em diferenças na remuneração. Estas diferentes contribuições deveriam ser objeto de contratos específicos que também podem ter cláusulas de conversão em participação.
A remuneração por trabalho não tem nada a ver com a participação societária. O sócio com maior participação pode ter um pró-labore menor do que um sócio minoritário. Além disso, um sócio pode ser demitido como diretor e continuar com sua participação na empresa. A sociedade não tem obrigação de adquirir a sua participação, mas, via de regra, o sócio demitido tende a querer vender. Em muitas startups que ainda não dão lucro e têm seu valuation inflado por investidores de risco, isso pode dificultar a negociação. Mas se o founder demitido se der conta de que é sócio de uma dívida (pois muitos mútuos têm cláusulas de pagamento em caso de não conversão) sobre a qual tem pouca ou nenhuma influência verá que é do seu melhor interesse facilitar e acelerar sua saída da sociedade. No entanto, deve-se cuidar para não gerar grande animosidade, pois numa limitada o sócio demitido pode se recusar a assinar eventuais alterações contratuais necessárias ao bom funcionamento da companhia.